Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil.
Diretores acreditam que ano curricular poderá se estender até fevereiro de 2021 com retorno das aulas previsto para 1º de junho. Escolas estão fechadas há mais de 50 dias
Em 12 de março, o governador Ibaneis Rocha publicou decreto determinando a suspensão de aulas em virtude do risco de contágio de coronavírus nesses espaços. Com isso, as escolas do Distrito Federal estão de portas fechadas há mais de 50 dias. Embora o prazo se estenda até 31 de maio, ainda não há previsão de quando ou como isso ocorrerá, conforme informou o chefe do Buriti nas redes sociais, em 26 de abril. Até lá, pais, responsáveis e estudantes se perguntam se o semestre, ou mesmo o ano letivo, está perdido, enquanto gestores de instituições de ensino pensem maneiras de finalizar a carga horária necessária.
Embora o Governo do Distrito Federal (GDF) tenha dado início ao uso de plataforma digital para alunos do Ensino Médio, o secretário de Educação, João Pedro Ferraz, já havia declarado, em uma live nas redes sociais da pasta, que as aulas on-line não serão contabilizadas como dia letivo. Ele afirmou, ainda, que será possível cumprir o ano letivo até o fim de 2020, graças a uma medida federal que permite a flexibilização dos 200 dias obrigatórios. A Secretaria de Educação informou, por meio de nota oficial, que vai entregar ao governador um plano de retorno. “O governo vai considerar o quadro de evolução da pandemia. Neste momento, as áreas estão voltadas para fazer uma proposta que leve em conta as recomendações das autoridades de saúde e que não ofereça riscos a estudantes, professores e demais servidores que atuam nas escolas”, afirma o texto.
Os dirigentes das escolas, no entanto, preveem a possibilidade de estender o ano letivo até janeiro ou fevereiro de 2021. Ana Ellen Ferreira, diretora do Centro de Ensino Fundamental (CEF) 15 do Gama, acredita que essa é uma opção melhor do que aulas aos sábados, quando o comparecimento de alunos é menor. “Seis dias por semana é engodo, porque a maioria dos meninos não vem”, argumenta. Outra possibilidade é a de incluir atividades extraclasses ou on-line para cumprir a carga horária necessária.
Caso os colégios retomem as classes em 1º de junho, no entanto, o primeiro semestre só deverá ser concluído em meados de agosto. “Neste ano, nós só tivemos 20 dias de aula”, ressalta a diretora. Ana Ellen calcula que, caso seja permitida a redução de 200 para 160 dias letivos, o ano poderá ser concluído até 22 de dezembro. Até lá, professores incentivam os alunos a manter os estudos em casa. “Fizemos lives e colocamos atividades nas redes sociais para que eles não fiquem ociosos nem percam o modo de estudar. Ficar muito tempo afastado traz o desestímulo, e nós nos preocupamos com a questão da evasão”, explica.
Katrina Wander, 35 anos, está receosa de mandar o filho de volta para a escola. Jorge, 4, estuda no Jardim de Infância da 102 Sul. “Prefiro que não volte, até porque ele tem um histórico de asma. Ninguém sabe a extensão dessa pandemia aqui no Distrito Federal. Quando vi que o governo ia voltar com as aulas, decidi que não ia mandá-lo para a escola”. Ainda assim, ela conta que tem dificuldade em manter as atividades pedagógicas da criança em casa. “Ele não está sendo alfabetizado ainda, mas os pais não têm orientação de como ensinar nem fazer exercícios lúdicos com as crianças, então é difícil.”
Ensino privado
As escolas particulares também se esforçam para não perder o ano letivo. “A gente cumpre uma carga horária muito maior do que a mínima exigida, isso favorece para que não exista essa possibilidade”, afirma a diretora do colégio COC do Lago Norte, Kátia Catta Preta. Segundo ela, caso as aulas retornem até julho, é possível repor todos os dias que a escola esteve parada. “Já fizemos uma prévia de um calendário, teríamos que utilizar também todo o mês de férias de julho e dezembro, e retomaríamos em 2021 normalmente.”
Alguns pais defendem que o retorno agora é precipitado. Mãe de Miguel, 7 anos, Emannuelle Caiafa, 41, acredita que é melhor esperar a análise do GDF para tomar alguma decisão. “Diversas crianças têm problemas respiratórios, é muito arriscado”, adverte. O filho estuda no Colégio Marista João Paulo II, na Asa Norte. Para ela, um dos obstáculos é fazer com que as crianças usem máscaras por muito tempo. “É uma dificuldade para o meu filho, mesmo que por cinco minutos. Como exigir isso para crianças com menos de dez anos, sem maturidade?”, questiona.
De acordo com a Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do Distrito Federal (Aspa-DF), a comunidade escolar precisa reorganizar o calendário. Alexandre Veloso, presidente da instituição, acredita que os estudantes do ensino médio serão os mais afetados. “Todos perdem, mas a criança na alfabetização, ou na trilha educacional ainda tem muitos anos pela frente para recuperar essa perda momentânea. Os adolescentes, prestes a fazer vestibular serão mais atingidos, caso não haja uma flexibilização do conteúdo cobrado, assim como do período das provas”, avalia. Ele reforça que existe previsão legal para que o ano letivo tenha continuidade em 2021.
Professores também estão preocupados com a situação, mas, o sindicato da categoria (Sinpro-DF) deve aguardar o fim da suspensão para decidir as medidas adotadas. “A gente só pode fazer projeções depois que as aulas presenciais forem liberadas. Hoje, o isolamento social é necessário. Após liberação da Organização Mundial de Saúde (OMS), sentaremos para discutir o novo calendário escolar”, frisou Samuel Fernandes, diretor do Sinpro.
Quatro perguntas para Catarina de Almeida Santos, professora adjunta da Faculdade de Educação (FE) da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do Comitê DF da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Como fica o ano letivo com as escolas paradas por tanto tempo?
O ano civil acaba em 31 de dezembro, mas o ano letivo pode ser mais flexível. Já teve vários casos, não só na educação básica, em que o ano letivo passa para o ano seguinte. Isso vai depender do cenário, de quando vamos poder retomar as aulas de forma segura.
Seria melhor voltarmos com aulas presenciais ou mantermos as atividades por educação a distância?
Por um lado, se voltarmos agora, corre o risco de existir uma contaminação em massa. Por outro, a aula a distância pode fazer com que grande parte dos estudantes não aprenda, e uma outra parte seja excluída do processo educativo. Isso acontece porque uma parcela dos alunos não tem condição de aprender sem a presença dos seus professores e porque uma outra parte não vai conseguir ter acesso nem aos materiais escolares. Corremos o risco de aumentar as desigualdades educacionais que já existem em função das desigualdades sociais.
Quais os efeitos de voltar com as aulas agora?
Corremos risco de ter estudante que volta para a sala de aula em que os professores não estarão mais porque estão contaminados, ou o contrário, estudantes que não voltam. Ou podem retornar estudantes que perderam o emprego, tiveram o salário reduzido, num processo de caos social muito grande. É preciso pensar em como ter uma formação e uma base de tranquilidade social nesse momento, de modo que consigamos voltar para o sistema de ensino e dar continuidade, retomar de onde parou.
Qual a melhor saída?
O mais importante não é o calendário, mas preservar a vida das pessoas. Não adianta continuar sem que ninguém aprenda, ou voltar às aulas presenciais e colocar as pessoas em risco. É importante um debate intersetorial, que promova a formação, inclusive dos professores, sobre a pandemia e tudo o que estamos vivendo. E pensarem ações de como vamos retornar, garantindo segurança, acolhimento, para professores e estudantes. Não é possível imaginar que vamos voltar para o sistema de ensino sem precisar refazer as condições, como se não tivéssemos passado por este processo.
Saiba mais
Em uma publicação no Instagram e no Facebook, o governador Ibaneis Rocha informou que as secretarias de Educação e Saúde analisam de que forma poderá ser feita a volta às aulas. “Não há data prevista. O importante é ter segurança e responsabilidade para salvar vidas”, diz o comunicado, dado dias depois do chefe do Executivo local ter se reunido com o presidente da República, Jair Bolsonaro, para debater a reabertura dos colégios cívico-militares da capital federal.
Fonte: Correio Braziliense.