Em fase final de discussão no Senado, a reforma do sistema previdenciário, institui idade mínima para que trabalhadores possam passar para a inatividade e reduzindo valores das pensões por morte. Quem já está no mercado de trabalho entrará no sistema de transição.
A reforma da Previdência, com uma previsão de economia um terço menor do que a versão enviada pelo governo passará pela última fase de avaliação nas próximas semanas, após quase oito meses de debates no Congresso. Entre outros pontos, já está definido que a idade mínima para a aposentadoria será de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, que a pensão por morte não será integral em todos os casos e que todos os salários de contribuição — inclusive os 20% mais baixos, hoje descontados — passarão a entrar no cálculo do benefício, que, dessa forma, terá o valor reduzido em relação ao método atual.
Portanto, quem está no mercado de trabalho e, principalmente, quem ainda não entrou deve se preparar para as mudanças, que começam a valer na totalidade 90 dias depois que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 6/2019 for promulgada, o que acontecerá logo após a aprovação em segundo turno no plenário do Senado. Valem de imediato as regras básicas de parâmetro, como idade mínima e exigência de tempo de contribuição. Mas as novas alíquotas previdenciárias para os servidores começam a valer só no início de 2020, se a votação acontecer até o fim de outubro.
Contudo, os trabalhadores da ativa podem escolher a regra de transição mais vantajosa: por sistema de pontos, por idade mínima e tempo de contribuição, por idade ou pagando pedágio de 100% sobre o tempo que ainda falta para aposentadoria. Os que estiverem mais perto de se aposentar, faltando dois anos ou menos, têm uma quinta opção, com pedágio mais baixo, de 50%. Já quem ainda não trabalha vai ficar vinculado automaticamente às novas regras.
O valor da aposentadoria ainda pode variar, cumprida a idade mínima e o tempo de contribuição. Começa com 60% do benefício integral e sobe 2 pontos percentuais a cada ano extra trabalhado. O que significa que as mulheres só receberão 100% do benefício após 35 anos de contribuição e os homens, depois de 40 anos.
A reforma também afeta aposentadorias e pensões por morte. No segundo caso, o cálculo também muda: em vez de ser 100% da aposentadoria a que o beneficiário falecido teria direito, como é hoje, passa a ser de 50%, mais uma cota de 10% por dependente. Uma viúva sozinha receberá, portanto, 60% do valor. Só chega a 100% se tiver quatro filhos.
Propostos na reforma, pelos cálculos da equipe econômica, o governo poderá economizar R$ 800,3 bilhões em 10 anos com os vários cortes de despesas, caso os senadores não façam mais nenhuma mudança no texto, aprovado em primeiro turno na última terça-feira. A cifra é R$ 436,2 bilhões menor do que a prevista na proposta original e ficou R$ 200 bilhões abaixo do “limite” de R$1 trilhão estabelecido inicialmente pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.
Dessa perda, R$ 133,2 bilhões se devem a mudanças feitas no Senado, nos últimos dois meses. A principal delas, que custou R$ 76,4 bilhões, passou na última terça-feira, durante a votação de destaques em primeiro turno no plenário da Casa. Em uma derrota gritante para o governo, pouco depois de os senadores terem aprovado o texto-base com sete votos a mais do que os 49 necessários, os senadores resolveram reverter a alteração proposta para o abono salarial, incluída no parecer do relator, Tasso Jereissati (PSDB-CE).
Apenas para quem recebe até R$ 1,3 mil por mês, o benefício, que seria pago volta a valer para todos os trabalhadores que ganham até dois salários mínimos (R$ 1.996, este ano). O baque para governistas e defensores da reforma foi tão forte que, logo em seguida, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-RJ), encerrou a sessão e só retomou as votações de destaques no dia seguinte.
A partir de agora, para que nenhum outro ponto seja mudado, o governo não pode cometer o mesmo erro de estratégia, e precisa garantir 49 votos contrários para barrar cada alteração que for sugerida. No segundo turno de votação, os senadores só podem propor emendas supressivas, que retiram algum trecho da Proposta de Emenda à Constituição (PEC).
A oposição, por exemplo, vai tentar retirar a alíquota extraordinária criada para servidores públicos e a necessidade de contribuição para o servidor inativo que recebe menos de cinco salários mínimos. Também está na pretenção acabar com a exigência de idade mínima para aposentadoria por invalidez, assunto que já foi tema de várias emendas e destaques durante a tramitação da matéria, e aposentadorias especiais. “A vinculação de contribuição com idade inviabiliza a aposentadoria especial para quem atua em área insalubre, penosa e periculosa”, explicou o senador Paulo Paim (PT-RS).
Já haviam sido feitos pelo próprio Jereissati, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), outros ajustes, que, juntos, custaram R$ 56,8 bilhões. Ele voltou a vincular a pensão por morte ao salário mínimo, retirou o dispositivo que colocava os critérios de acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) na Constituição, além do gatilho que dificultava a aposentadoria de trabalhadores expostos a agentes nocivos e o trecho que instituiria uma cobrança previdenciária de anistiados políticos.
Por obra da Câmara, as outras mudanças diminuíram a economia em R$ 303 bilhões. Logo de cara, os deputados tiraram o ponto que mais era defendido pela equipe econômica: o sistema de capitalização. Eles também alteraram parte da chamada “espinha dorsal” da reforma, como a idade mínima, que o governo almejava que fosse de 65 anos para homens e mulheres, e o tempo de contribuição, que a ideia inicial era que fosse de 20 anos para ambos.
Portanto, o limite ficou em 65/62 anos (homens/mulheres), com 15 de contribuição. No caso de homens que ainda não entraram no mercado de trabalho, a cobrança de 20 anos de contribuição foi mantida, mas pode cair para 15 anos se for aprovada a chamada PEC paralela, criada para tratar de temas deixados de lado na reforma principal, para não atrasar a tramitação. Os deputados também cortaram mudanças no BPC, que o governo queria reduzir, e nas aposentadorias rurais.
Contratempos
O grande impasse, agora, apesar da apreensão de parte da equipe econômica com outros eventuais cortes, tem mais a ver com a questão política do que com o texto. Guedes se posicionou claramente insatisfeito com as mudanças feitas no Senado e com a manutenção das regras atuais para o abono, na Câmara, que declinou a capitalização. Nas duas ocasiões, as queixas só serviram para piorar a relação entre o Executivo e o Legislativo.
O atraso de semanas na votação do segundo turno é devido a esse estremecimento. Desta vez, Guedes afirma que vai compensar as perdas na reforma no projeto do pacto federativo, que busca descentralizar a arrecadação e mudar a distribuição dos recursos entre União, estados e municípios. A observação foi encarada como uma afronta aos parlamentares, que já reclamavam do não cumprimento de compromissos do governo.
Caso as pendências não sejam resolvidas, os senadores não estão dispostos a avaliar a reforma em segundo turno. Entre elas, a liberação de emendas parlamentares e a garantia de que a divisão entre estados e municípios dos recursos do megaleilão de petróleo, marcado para novembro, será feita conforme as regras aprovadas pelos senadores. Na Câmara, não há consenso sobre a partilha.
“Nós fechamos um acordo entre o primeiro e o segundo turno da votação. Se não houver avanço nessas questões, não serão só o PT, o PSB, o PDT, o PSD que entrarão em obstrução, mas também o MDB e a Rede, que se comprometeram a não votar em segundo turno, se os temas relacionados à pauta federativa não caminharem na Câmara”, disse Rogério Carvalho (PT-SE), em referência ao pacto federativo.